2025, O ANO DA BATALHA GLOBAL ENTRE MÚSICOS E IA

CARTA GLOBAL, PROTESTOS E NOVAS LEIS AQUECERAM O DEBATE SOBRE DIREITOS AUTORAIS E INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

2025, O ANO DA BATALHA GLOBAL ENTRE MÚSICOS E IA

A discussão sobre o impacto da inteligência artificial na música ganhou novas dimensões em 2025. Depois de anos de avanços tecnológicos e experimentações ousadas, o debate deixou os bastidores e chegou ao centro da indústria. Artistas consagrados, plataformas de streaming, gravadoras e governos passaram a lidar com a mesma pergunta: como garantir inovação sem apagar o trabalho humano?

É um ano marcado por cartas abertas, protestos criativos, regras em discussão e acordos inéditos. E todos caminham na direção de um pedido claro da classe artística: ética, consentimento e remuneração justa.

A carta que virou referência global

Crédito da imagem: Billie Eilish em foto promocional. Reprodução: Facebook.

Em abril de 2024 — e ainda ecoando em 2025 — um grupo de mais de 200 artistas internacionais assinou a carta “Stop Devaluing Music”, publicada pela Artist Rights Alliance (ARA). Os nomes envolvidos chamaram atenção: Billie Eilish, Katy Perry, Stevie Wonder, Nicki Minaj, entre muitos outros.

“Este ataque à criatividade humana deve ser interrompido. Devemos nos proteger contra o uso predatório da IA ​​para roubar as vozes e imagens de artistas profissionais, violar os direitos dos criadores e destruir o ecossistema musical.” — trecho da carta da ARA.

“O uso antiético da IA ​​generativa para substituir artistas humanos desvalorizará todo o ecossistema musical — tanto para artistas quanto para fãs.” — Jen Jacobsen, diretora executiva da ARA.

Eles alertaram para o risco de plataformas e desenvolvedores lançarem ferramentas capazes de imitar vozes, copiar estilos e treinar modelos de IA com obras protegidas, sem consentimento e sem pagamento. O documento também reconhece que a tecnologia pode ser positiva, desde que usada de forma responsável e com respeito ao criador original.

A carta ganhou força internacional, sendo citada em debates legislativos, em reuniões de gravadoras e em audiências com órgãos reguladores.

Para o público e para a indústria, ela se tornou um divisor de águas.

O protesto silencioso que fez barulho no Reino Unido

Crédito da imagem: Kate Bush no videoclipe da canção “Wuthering Heights” (1978). Reprodução: YouTube.

Enquanto os Estados Unidos reforçavam a discussão pelo caminho institucional, o Reino Unido escolheu uma abordagem simbólica — e surpreendente.

Em fevereiro, mais de 1.000 músicos britânicos lançaram o álbum “Is This What We Want?”, composto por faixas silenciosas gravadas em estúdios vazios. A ideia era simples e impactante: mostrar como seria um futuro em que a música humana fosse substituída por modelos generativos treinados sem limites.

“Na música do futuro, nossas vozes não serão ouvidas?” — Kate Bush.

Artistas como Kate Bush e Damon Albarn estiveram entre os nomes de destaque que aderiram à ação, organizada em protesto a uma proposta do governo britânico que permitiria a mineração de dados para IA com um modelo de opt-out — ou seja, o conteúdo poderia ser usado por padrão, a menos que o titular optasse tecnicamente por restringir o acesso.

“É um plano que não só seria desastroso para os músicos, como também é totalmente desnecessário: o Reino Unido pode ser líder em IA sem sacrificar nossas indústrias criativas de renome mundial.” — Declaração de Ed Newton-Rex, um dos organizadores da ação.

O álbum viralizou, entrou nas paradas digitais e rendeu debates acalorados na imprensa britânica. Em novembro, a campanha ganhou novo impulso quando Paul McCartney incluiu uma faixa silenciosa extra no lançamento em vinil.

Londres busca um meio-termo — e a indústria reage

A consulta pública do governo do Reino Unido propôs um modelo mais flexível de mineração de texto e dados para treinar sistemas de IA. A ideia é permitir o uso de obras acessíveis legalmente, desde que os titulares possam reservar seus direitos e exigir transparência das empresas de tecnologia.

Para músicos e compositores, o risco é claro: colocar sobre o criador a responsabilidade de “se proteger”, em um cenário em que arquivos são compartilhados e replicados com facilidade. Já para empresas de IA, permitir o uso por padrão aceleraria o desenvolvimento de modelos mais sofisticados.

O impasse abriu uma nova frente de discussões sobre como equilibrar inovação, direitos autorais e sustentabilidade artística.

As bandas de IA e o efeito cascata no streaming

Crédito da imagem: Banda virtual Velvet Sundown, criada por IA. Reprodução/Instagram.

2025 também foi o ano em que projetos totalmente gerados por inteligência artificial ultrapassaram a barreira do experimento e chegaram ao mercado. O caso da Velvet Sundown, uma banda declaradamente “sintética”, acumulou mais de 1 milhão de streams, chamando a atenção de artistas, críticos e executivos.

Com o avanço desse tipo de conteúdo, plataformas como Spotify e Deezer adotaram medidas de contrapeso. A Spotify anunciou a remoção de 75 milhões de faixas classificadas como spam, duplicações ou músicas geradas por IA sem critério. A Deezer passou a rotular explicitamente conteúdos criados por inteligência artificial e reforçou controles para impedir manipulação de números de execução e clonagem de vozes.

Essas ações mostram que o setor de streaming tenta encontrar formas de incentivar experimentações tecnológicas sem permitir abusos — e sem prejudicar os criadores humanos que sustentam o ecossistema musical.

A via do licenciamento: tecnologia com aval das gravadoras

Outra tendência que ganhou força é a busca por acordos formais entre grandes gravadoras e empresas de IA. Em outubro, a Universal Music Group firmou um acordo com a Udio, encerrando disputas judiciais e estabelecendo uma parceria para treinar modelos de IA a partir de catálogos autorizados.

O movimento aponta para um futuro possível: modelos de IA treinados com acesso legal, pagamento garantido e controle dos titulares dos direitos. Para músicos e compositores, pode ser uma forma de transformar risco em oportunidade. Para a indústria, é uma chance de liderar a inovação em vez de apenas reagir a ela.

O que 2025 deixa como recado

A classe artística está longe de rejeitar a tecnologia. O que músicos, compositores, produtores e intérpretes pedem é clareza. Eles aceitam a IA como ferramenta criativa, mas rejeitam seu uso para apagar vozes, substituir estilos, treinar modelos sem autorização e retirar valor do trabalho humano.

A mensagem que ecoa em 2025 é clara:

A música pode evoluir com a inteligência artificial — mas só se os direitos dos músicos continuarem sendo respeitados.